RHEBECKA SOUZA

Somos seres com alma de borboleta, plena de beleza e harmonia, habitando num corpo onde as emoções e desejos, numa espécie de casulo nos aprisionam nos corpos físico, emocional, mental e espiritual, até que a compreensão e a consciência nos eleve ao que somos verdadeiramente, seres de luz.


terça-feira, 10 de agosto de 2010

ERA UMA VEZ DEUS

Em relação aos meninos normais, ele era praticamente incomparável.
Conseguia esticar e encolher à vontade. Virava do tamanho de uma antena de formiga, e depois maior que mil ronocerantes chifrudos e cascudos. Quando queria, tornava-se invisível, invadia qualquer coisa a qualquer hora, espiava todos os pensamentos e entendia as línguas mais enroladas. Também podia estar em dois lugares ao mesmo tempo. Isso parece complicado, mas não é: Deus era como o vento, que está no mesmo instante rodopiando a poeira de uma duna do deserto e arrepiando as ondas geladas do Pacífico.
Como todos os meninos, Deus adorava brincar.
Sempre que podia, fazia que era peixe e se atirava no oceano, sem ligar para corais ou tubarões. Os peixes-luz dos mares abissais corriam para iluminar suas cambalhotas toda vez que ele mergulhava fundo.
Deus também imitava os pássaros, mas não se disfarçava com asas. Planava sobre as árvores e despencava dos picos como Deus mesmo, totalmente feito de nada. Certa vez, ficoi tentando copiar o corpo de uma ave do paraíso, mas como esta era fruto da imaginação das pessoas e ele não, desistiu logo da idéia.
Já que podia tomar a forma que quisesse, Deus era bicho de manhã, planta de tarde, rocha de noite. Mas como as manhãs, tardes e noites divinas passam muito, muitissimo devagar, ele logo enjoava e procurava outra distração. Jogava dardos com os relâmpagos, batia bola com os planetas, acendia fogos de artifício com as estrelas, e até com buracos-negros do Universo ele arranjava um jeito de se divertir, montando quebra-cabeças com os mundos paralelos.
Deus só não podia uma coisa: brincar de esconde-esconde.
Ele via tudo, ouvia qualquer som, por mais baixinho ou desafinado que fosse, alcançava lugares remotos e, ainda por cima, tinha o dom de prever o futuro. Mas essa coisa de estar em todos os lugares ao mesmo tempo e de saber tudo antes dos outros estava lhe causando um sério problema. Para se esconder, é precsico estar em um lugar só. E para brincar, é necessário ter parceiros. Se continuasse daquele jeito, Deus ficaria só, sem brincar. Foi assim que resolveu se esconder nos meninos da Terra.
Fez um vôo rasante pelos cincos continentes, observou aqui e acolá e se decidiu por um país e forma de S garranchado, de quem ainda está aprendendo a escrever. Lá, numa cidade Hanói, escolheu um menino que colhia arroz nuns campos bem lisos. Levantou o chapéu de palha do camponesinho e mergulho, acomodando-se dentro da barriga do menino.
O menino parecia satisfeito.
Deus também.
Chegou o sábado e a meninada foi brincar. Um deles fechou os olhos e contou até dez enquanto os outros foram se esconder. Deus continuava encolhido na barriga do seu menino, que, por sua vez, se acocorou atrás de um feixe de bambu.
Em todas as suas andanças pelo Cosmos, Deus nunca havia experimentado um aventura assim. Pela primeira vez, teve dúvidas, não sabia se devia ficar parado ou pular no riacho vizinho, se permanecia quieto ou coaxando como uma rã (para despistar), ou até se devia sair correndo e se entregar logo.
Caramba: ele não sabia o que fazer. Estando dentro de um menino, já não podia espiar à vontade o pensamento dos outros ou advinhar quanto tempo a brincadeira levaria.
Deus não tinha a menor idéia: ia ou não ser descoberto?
É claro que foi, logo depois. Foi descoberto duas vezes.
Primeiro, pelo menino encarregado de achar os outros, pois ao encontrar o camponesinho atrás dos bambus, estava também apontando - mesmo sem saber - para Deus, escondido na barriga.
Acontece que naquele exato momento, quando um braço afastava as folhagens e gritava "Achei, Achei!, Deus ficou tão feliz com a nova brincadeira que começou a pular dentro do menino.
Deus pulou tanto, mas tanto, que o menino percebeu que havia alguma coisa nova dentro dele. Assim, Deus foi descoberto pela segunda vez, agora pelo menino em cuja barriga havia resolvido se enfiar.
Foi o inesperado que revelou Deus ao menino.
Quer dizer, foi por causa do ataque de legria de Deus que os dois souberam que eram a mesma coisa: ele o menino, o menino e ele.
O menino não estranhou.
Deus estranhou um pouquinho, mas é que ele não estava acostumado às surpresas da vida.
Desde então, no país chamado Vietnã, é sinal de desrespeit acariciar a cabeça das crianças. Pois todos se lembram que foi através do cocuruto de um camponesinho que Deus conquistou, finalmente, companhia."
Não sei quem é o autor- Encontrei o texto no livro Raja Yoga - Quebrando Correntes/Suely Firmino - Ed. Madras.

ino - Ed. Madras

Nenhum comentário:

Postar um comentário